Combate ao desperdício alimentar: qual é a estratégia?

Comemos muito e desperdiçamos muita comida. Este é um fenómeno próprio de uma sociedade que, sendo de consumo, é também de desperdício

09 · 08 · 2019

A alimentação sustentável requer o combate ao desperdício alimentar, o qual tem merecido uma especial atenção na última década. É que, além do consumo execessivo de recursos ambientais associados a qualquer forma de desaproveitamento, no caso do desperdício alimentar somos ainda confrontados com o facto de milhões de toneladas de alimentos serem lançados ao lixo anualmente, num planeta onde um sexto da população mundial passa fome.

De acordo com o artigo "Desperdício Alimentar e Economia Circular: como dar a volta ao lixo delicioso", escrito por Inês Garcia no site Circular Economy Portugal, "se os impactos sociais são há muito conhecidos e reconhecidos (mas nunca resolvidos), os impactos económicos foram recentemente estimados pela FAO- Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura e pela União Europeia: um terço de toda a produção alimentar humana é desperdício. Na Europa, cerca de 88 milhões de toneladas de alimentos são desaproveitados anualmente, com um custo associado de 143 biliões de euros. Em Portugal, 1 milhão de toneladas de alimentos são deitados para o lixo, o que levou à publicação de um conjunto de medidas no âmbito da Comissão Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar."

Para além de inúmeras iniciativas privadas, os diferentes níveis de governação têm em curso políticas públicas multidisciplinares para enfrentar este desafio, que é de todos, desde o produtor ao consumidor. Ao nível da União Europeia, o “Pacote Economia Circular” inclui este objetivo numa perspetiva integrada. Em Portugal, a Comissão Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar integra 6 áreas governativas em ligação com a sociedade civil.

O desperdício alimentar é responsável por uma emissão de gases de efeito de estufa equivalente à da rede global de transportes terrestres. Segundo a FAO , citada no artigo por Inês Garcia, "se o Desperdício Alimentar Mundial fosse um país, seria o terceiro emissor destes gases, logo a seguir à China e aos Estados Unidos, contribuindo para o aquecimento global".

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O mesmo artigo também sugere que a situação é, porém, reversível. "Reintegrando os resíduos na economia, enquanto recursos, e maximizando a eficiência destes ao longo de toda a cadeia de valor, obtém-se aquilo a que a Economia Circular chama “ciclo fechado”: nada se perde, tudo se transforma, num reaproveitamento amigo da natureza". Acrescenta ainda que "este modelo económico, que quer pôr fim a todos os tipos de desperdício, constitui um contributo promissor para o cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas para 2030, dos quais uma das metas é reduzir para metade o desperdício de alimentos per capita a nível do retalho e do consumidor e reduzir as perdas de alimentos ao longo das cadeias de produção e de abastecimento".

Hoje em dia é imprescindível criar medidas que permitam colocar o mundo no caminho do “desperdício zero”, e é necessário para o ambiente diminuir o desperdício.

Em Portugal surgiram várias iniciativas que trabalham para evitar os desperdícios ao longo de toda a cadeia de abastecimento alimentar, na exploração agrícola, nas lojas e nos restaurantes. Veja os exemplos mencionados no artigo "Desperdício Alimentar e Economia Circular": 

  • A Re-food, Movimento 2020 e a Dariacordar/Zero Desperdício são associações sem fins lucrativos que, voluntariamente, recolhem os alimentos, tais como sobras de refeições e alimentos que se aproximam do fim da data de validade, a partir de uma vasta rede de dadores (supermercados, restaurante, cafés, hospitais e hotéis) para depois distribuir pelas famílias carenciadas.
  • A cooperativa Fruta Feia trabalha diretamente com os agricultores para escoar as frutas e legumes que não cumprem a Normalização, ou seja, o conjunto de regras de calibre, cor e formato.
  • O GoodAfter.com é um supermercado online dedicado à venda de produtos que se encontram perto do fim do prazo de consumo preferencial, ou mesmo ultrapassado desse prazo.
  • O projeto Muita Fruta pretende mapear, recuperar, cuidar e usar de modo sustentável as inúmeras árvores de fruto da cidade de Lisboa. Para tal, tem vindo a realizar um conjunto de atividades para combater o desperdício: workshops para podar árvores, confeção de compotas, jantares com chefes de cozinha, etc.

Ler a data de validade ajuda a combater o desperdício alimentar

As datas de validade não são todas iguais e saber distingui-las pode ajudar a diminuir o desperdício alimentar. É isto que mostra uma nova campanha da Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED).


Há produtos que estão a aproximar-se do fim de vida comercial, mas ainda estão em condições excelentes de consumo, entre estes produtos constam, por exemplo, bolachas ou conservas, entre outros. São produtos que têm segurança alimentar, mas do ponto de vista comercial já não podem ser vendidos. O objetivo desta campanha é rentabilizar o consumo dos produtos alimentares e, acima de tudo, evitar o seu desperdício.

Assim, em todos associados da APED, nos quais se contam as cadeias Aldi, Continente (do grupo Sonae), DIA - Minipreço, El Corte Inglés, Intermarché, Ikea, Jumbo/Pão de Açúcar, Lidl, Novo Horizonte e Pingo Doce, haverá informação sobre como ler os prazos de validade, nas lojas e online.

O site da APED também terá informação a esclarecer as diferenças entre data limite de consumo e datas de durabilidade mínima, além de um conjunto de dicas para conservar os produtos, e explicação sobre quais os produtos sem validade ou produtos com indicação de aproximação de fim de prazo de validade.

Em suma…

O desperdício alimentar está implícito numa sociedade de consumo. Não é apenas um problema ético e económico, estando também relacionado com a diminuição dos recursos naturais.

Todos os atores da cadeia alimentar têm um papel a desempenhar na prevenção e redução do desperdício alimentar, desde aqueles que produzem o alimento (agricultores, fabricantes alimentares), aos órgãos políticos, àqueles que disponibilizam os produtos para serem consumido (retalhistas e setor hoteleiro) e por último os próprios consumidores.

Por fim, cada indivíduo deve envolver-se ativamente na promoção de uma alimentação saudável, que contribua para a diminuição do desperdício alimentar e para a sustentabilidade dos recursos naturais.